quarta-feira, 22 de junho de 2011

As Mulheres ( Parte Dois)

O culto da Deusa Mãe (também denominada de Mãe Terra) terá as suas origens na Pré-história. Representa uma divindade feminina, a mulher fértil, em consonância com o povoamento da Terra e os ciclos produtivos desta. É um culto à Mulher que pare os seus filhos e, paralelamente, à Terra que, das suas entranhas, os alimenta. Os povos curvam-se à sua imagem, adoram-na, clamam por ela: Reia para os gregos ou Cibele para os romanos identificam a mesma Mãe, a mesma Mulher procriadora, que enche as aldeias, que as fortalece e lhes dá esperança.
Os tempos mudam, os exércitos conquistam, as cidades crescem e as deusas recebem os devidos cultos. Agora são belas, voltadas para o amor. A cultura grega ajoelha perante Afrodite, a romana inclina-se a Vénus, a africana homenageia Óxum.
Mas os guerreiros, os estadistas e os supremos das religiões tanto adoram as suas belas deusas, que personificam as mulheres terrenas, como oferecem estas, as virgens, em sacrifícios ao seu deus mais temido, mais exigente de sangue.
Aparte deusas e sacerdotisas (com dois ou mais braços) e, enquanto os anos avançam, a mente humana não muda muito os seus propósitos de punir a Mulher, como expiação dos seus pecados! Nascer mulher é já em si um mal maior: insinua o desejo carnal, simboliza a tentação do demónio! – Gritam os ministros das leis divinas!"Reza minha filha para que a tua beleza se apague depressa!" São comuns os apedrejamentos selvagens para castigar delitos  apontadas,  apenas, a elas. Depois, são torturadas em máquinas diabólicas, são esticadas, desventradas, afogadas, queimadas. Basta conhecer umas ervas curativas ou carregar no corpo um sinalzito, liso ou encabelado, para que lhe seja apontada a inevitável visita de Satanás: "é necessária uma purificação pelo fogo!" Tudo concretizado por uns poucos denominados agentes do senhor, eleitos para travar o avanço do Maldito. No fim, depois de organizar a limpeza de ferros e grilhões, vão ganhar calo a ajoelhar aos pés de Jesus crucificado, que muito pregou o amor, e de Maria, por eles considerada Deusa Mãe, ou não teriam erguido em Seu nome tantos santuários!
Mas as mulheres sobrevivem e vencem. E fazem coisas tão banais, mas tão criticáveis por uma sociedade, que custou a aceitar um simples corte de cabelo, ou o abandono do lenço na cabeça, mais recentemente rendilhado e transparente - hoje, e muito bem, esta mesma sociedade vê muito mal a obrigação de panos a cobrir as mulheres islamitas, que ainda não se livraram dos preconceitos religiosos. E, com grande coragem, começam a usar calças, indiferentes às observações das amigas, das sogras e das outras que, por enquanto, não se atreveram a tal coisa e sempre vão comentando: “pensei que fulana era mais séria”! Os rolos nos cabelos são mais tolerados. E a pasta no bigode! Ah, que engraçada era a expressão do irmãozito a olhar a vermelhidão e as borbulhas: "se calhar a coitada pôs mostarda a mais no bife"! Mas olhando bem: "e aquela coisa branca em volta dos olhos! Nem pestanejam!" E não vale a pena tentar falar com ela, porque não haverá resposta, ou cai por terra o trabalho da pintura de lábios: "coitada, sempre de boca aberta!"
Agora é tudo muito mais simples: as mulheres frequentam amiúde os salões de beleza e sujeitam-se a coisas estranhíssimas; por vezes ficam sentadas horas debaixo dum capacete mais esquisito que os dos astronautas! Mas que saem de lá mais belas, lá isso saem! E até  começam a exigir que os companheiros também façam coisas, como depilações, algumas em zonas que, só de pensar, causa arrepios! Vão ao ginásio bufar um bocado e não esquecem as braçadas na piscina. E não é raro perguntar-se à sogra pela nora, porque ultimamente não se lhe tem posto a vista em cima, e obter respostas como esta: "a minha nora agora chega sempre muito tarde, sabe; trabalha muito e, depois, ora vai ao ginásio pegar nuns pesos, ora vai lavar o cu à piscina!"
São, as nossas mulheres de hoje, mais belas, mais atrevidas, mais conscientes da vida como ela é, ou deverá ser. Exigem delas e exigem deles: seja na divisão de algumas tarefas caseiras, seja nos assuntos sexuais, de que já não fazem tabu. E até vão dando uma ajudinha aos mais necessitados, com lingeries transparentes, vermelhas, reduzidas a um fio; por vezes com gestos que outrora seriam impensáveis numa senhora honrada. As mais velhinhas ainda não aceitam isto. Ainda é comum ouvir-se: "oh meu filho, o falecido nunca me viu"! E terá alguma razão, porque o dito trabalhava no duro, jantava o pouco que havia, ia até à venda do ti João, jogava à bisca, bebia mais dois copos, contava uma anedota e ouvia outras e, quando chegava a casa alegrote e bem-disposto, pensava apenas, e sem perda de muito tempo, soltar um cabeçudo enrabichado – entre os bastantes, o mais atrevidote. Daria, assim, razão ao padre-cura que, em todos os Domingos, sempre pregava em alto e bom som: "os filhos são a nossa maior alegria"

A Mulher de hoje continua a ser adorada. De maneira diferente, é certo, mas do modo que ela quer. Traça o seu rumo, marca o seu objectivo e o Planeta vai acompanhando, vai aceitando. Ocupa as empresas com mestria, está presente nos Parlamentos marcando pontos, chega  à chefia dos Governos com brilho e competência. Quem sabe, um dia, não atinge o topo  das  religiões, por ora intransigentes! Gostaria de ver… No entretanto, para uma delas  com enorme importância já temos o nome no feminino...

terça-feira, 14 de junho de 2011

As Mulheres

Segundo as Escrituras a mulher saiu do homem, para depois o homem sair da mulher. O Livro conta que foi retirada uma costela ao primeiro macho, com o intuito de criar uma fêmea para lhe fazer companhia, uma vez que, ultimamente, ele andava muito sisudo, nervoso e já não brincava com os outros animaizinhos; pelo contrário, encostava-se a um canto isolado, quebrado, incapaz de qualquer reacção. Por outro lado, uma segunda criação permitiria corrigir certos aspectos, que só ocorrem após uma verificação exaustiva. Costuma dizer-se que a obra quando acaba devia estar a começar. Este caso não era muito diferente: O macho apresentava um queixo demasiado saliente e a fronte a modos que fugia para trás, num plano inclinado. Era um rosto com aproximação óbvia para o focinho. Por outro lado a inteligência não primava pela abundância.
Assim, enquanto macho dormia fez-se a operação, sem que ele se apercebesse. Não foi necessária anestesia nem pancada na cabeça, porque a Deus tudo é possível. Assim como o operado ter ficado completo, sem defeito, a caminhar sem inclinação. E com menos um osso!
Quando o macho acordou sentiu de imediato uma respiração ao lado. Ali estava aquela criatura, num sono profundo, sossegado. E gostou do que viu. Olhou, bastante admirado e voltou-se para o Céu num murmúrio: “Quem é?!” Pelos vistos não obteve resposta, certamente por que ainda não tinha qualquer feito que merecesse algum diálogo; nem sequer se atrevera a fazer um mísero holocausto, com um coelhito ou uma pomba! E nestas coisas tem que haver sempre uma troca, senão não será possível um reconhecimento… Mesmo assim, voltou-se para Nascente, ajoelhou e agradeceu.
O macho olhou mais uma vez para a sua companhia e notou algo de diferente: Ela tinha dois altos no meio, ali bem em frente. Os bicos eram parecidos com os seus, mas estavam no centro de dois inchaços, que ao toque eram bem macios… E gostou do que viu. Verificou de novo, virou-se dum lado, virou-se do outro e, nesta observação pormenorizada, reparou numa falha, no seu entender, enorme. Faltava-lhe aquela coisa! Melhor, pensou. No outro dia tinha batido com aquilo num tronco de árvore e doeu. Mas lá que era estranho, era! Tornou a olhar para o Alto: “como é que isto aconteceu!?” Não houve resposta, de novo. Assim sendo, o melhor seria analisar com mais atenção, uma vez que pêlo havia… E foi nesse momento que o seu espanto aumentou! Chegou-se melhor. E gostou do que viu. Espreitou, chegou-se ainda mais e, como se não nos ensinam a gente inventa, o nariz experimentou uma humidade com odor indecifrável. Não… não parecia adequado e era até desconfortável… Convenhamos que o primeiro nariz não fora concebido com aquela finura que muito mais tarde conseguiu ter, mercê dum natural aperfeiçoamento dos seres vivos. Aquele não era aquilino, mas antes bastante achatado. Mas foi nesse preciso momento que, ou por sabor ou por cheiro ou por outra qualquer circunstância de que nunca chegaremos a saber, o macho sentiu um estremecimento da cabeça aos pés, como se fora uma faísca em correria louca, e ergueu-se bem para cima em busca duma resposta cabal de todos os deuses… Então entendeu! Realmente o nariz não era apropriado!
Entretanto a fêmea acordou do seu longo sono de criação. Nesse momento dormia a seu lado aquela criatura! Roncava e “fervia papas”, circunstância menos agradável. Procedeu à sua análise e não precisou de muito tempo para compreender a sua missão. Olhou o ambiente, aspirou o ar e sentiu-se bem, muito bem, muito confiante. Levantou-se, deu uma volta curta, refrescou-se num riacho ali perto, comeu um fruto, experimentou uma certa vibração, tornou a olhar em redor. E gostou do que viu. Quando o companheiro acordou, ela já estava ali sentada. Sorriu para ele, divertiu-se com os seus gestos meio desastrados, pegou-lhe na mão e pôs-se a seu lado. Gesto simples e inteligente, revelador duma soberba criação, que viria a aperfeiçoar-se com o decorrer do tempo. Com um sorriso levou-o para o primeiro reconhecimento territorial do ser humano.
Seguem-se dias de grande felicidade. A mulher, nome entretanto dado à fêmea, denota mais harmonia, mais saber escondido, até caminha com mais elegância. Por outro lado não apresenta aqueles humores desproporcionados que se vêem nele. Muito dedicada ao seu cantinho, mantém-no sempre limpo, bem cuidado. Apanha umas flores e coloca-as num buraco da rocha. Distribui as frutas, então colhidas, uma para ele (a maior), outra para ela. Vê-o embevecido, até meio apalermado, e acha piada. “Como é tão fácil alegrá-lo!” A vida a dois promete ser bonita. Quando ele se afasta para caçar, ela colhe margaridas, faz duas braceletes e um colar, adorna-se e aguarda, para mais uma vez sentir aquele prazer de o ver completamente derretido. Está divertida!
Quando vem a noite e o companheiro dorme, sempre ruidoso, a mulher permanece mais tempo acordada, o que lhe permite observar, pensar e idealizar melhor as tarefas para o dia seguinte. E num destes momentos em que ela olha o firmamento, levanta os joelhos e abre-os ligeiramente, ficando, assim, exposta. - Muito mais tarde e, em alusão a esta postura, Saramago, num discurso frontal, sem rodeios, escreverá que “assim têm de estar abertas as pernas das mulheres para o que entra e para o que sai”. E é no momento referido que ela imagina que duas daquelas estrelas são os olhos do companheiro bem juntos dos dela, numa posição mais cómoda, mais compatível com sua origem humanóide. Seria tempo de melhorar uma situação de que somente ele desfrutava, com apetites cada vez mais frequentes e com uma rapidez imprópria; acto desinteressante, desconfortável, dorido, bruto, rudimentar. Um frete! Ademais aquela manápula na nuca é humilhante! Frente a frente haveria uma mistura de sentimentos, um arfar conjunto. As bocas viriam a unir-se muito mais tarde.
Iria convencê-lo, sem dúvida, para as atitudes que ela achava melhor. Para ele a caça era o ideal. Fazia-lhe bem descarregar toda aquela rudeza, aquela valentia de macho dominante para, depois, regressar com algum bicho ao ombro, mais sereno, mais cooperante, mais dócil. O comer a carne em conjunto também reforçava a união.
Na planície, agora chamada Aldeia, já há várias mulheres e também há homens, circunstância perfeitamente natural. Não o será da mesma forma, quando a existência de casais também abunda, porque se o primeiro filho conheceu mulher, temos aqui uma situação aberrante, que será melhor não adiantar. Forma-se, então, uma comunidade. Percorrem-se grandes espaços, exploram-se os montes, varia-se a comida, assam-se os bichos. Enquanto eles se juntam a um canto a descrever façanhas e a aumentar as babosices, as mulheres prosseguem a lida, organizam-se, tornam-se o centro da família, aquecem o espaço, planeiam as acções. Ainda não votam no candidato a chefe tribal, mas é necessária paciência. Tudo a seu tempo.
Na ausência deles as mulheres juntam-se e conversam sobre tudo. Contam peripécias, descrevem comportamentos, pedem opiniões, confidenciam incompetências na hora da verdade e, especialmente, riem, riem muito. Estão francamente divertidas! Encontram soluções e preparam-se para os seus ensinamentos, de forma discreta, sem ofender susceptibilidades, prontas a reforçarem a união e a mostrarem que, por vezes, o caminho se faz apontando o dedo na direcção certa quando a realização quotidiana é menos conseguida…
O espaço a conquistar é, por ora, este. Nada de extraordinário. Outros muito maiores e exigentes se seguirão. Mas as mulheres estão cientes do seu poder, da sua perseverança e do esperado êxito. Elas pensam, planeiam, realizam e esperam…

terça-feira, 7 de junho de 2011

o Amor

O amor começou com a história de Eva e Adão. Temos como fundo o Paraíso com toda a sua beleza: Muita verdura, muitas árvores, riachos, enfim, um local encantado, abençoado e partilhado por dois corpos nus, desfrutando do excelente ambiente e entregando-se a todos os prazeres da boa vida que lhes havia sido permitida. Mas o olho que tudo vê lá estava em observação constante, ajuizando as acções. E muitas vezes o Senhor terá corado de vergonha ao presenciar a volúpia daqueles dois e, quem sabe, terá até tapado os supremos e sensíveis ouvidos, perante uns ruídos até então desconhecidos. O fruto da Sua sábia criação, o Seu expoente máximo demonstrava um estranho comportamento. Seria possível que um simples fruto, por mais sagrado que fosse, proveniente da douta árvore proporcionasse esta tamanha satisfação!? Havia sido dada uma ordem simples: “ multiplicai-vos”. O Senhor não se lembrava de lhes ter ordenado que cometessem tais impropérios. Nem poderia! A Sua divina sabedoria jamais seria capaz de lhes ensinar tais coisas! Uma reflexão profunda era necessária, assim como uma tomada de posição.

Veio a serpente, a maçã, a vergonha da nudez, vieram as parras, veio o motivo oportuno para resolver tamanho problema. Foram Eva e Adão expulsos do Éden: “Se quereis entregar-vos a tamanhos desmandos, praticai-os lá fora”. Ficou assim o jardim vazio de homem e mulher, porque o Senhor não se atreveu a repetir tal criação. E para afirmar a Sua ordem, colocou na entrada um anjo armado de espada flamejante, instrumento que virá, mais tarde, a ser copiado por Darth Vader e Luke Skywalker nas suas contendas galácticas de pai e filho.

Mas o amor não acaba, não pode acabar. E surge até entre os deuses, repleto de peripécias, de azedumes, de ciúmes, de tragédias. Recordemos Cibele e Átis, Afrodite e Adónis. Também acontece em situações mais terrenas, levando povos à guerra, como a de Tróia, com Helena e Páris em protagonismo. Entre reis, com Cleópatra e Marco António. Não esqueçamos, também, os romances de cavalaria. E mais pertinho de nós, tivemos Julieta e Romeu.

Portanto, vistas as coisas, o Senhor apenas não quis a paixão dentro do Jardim. Lá era um lugar sagrado; e em lugares assim não pode haver pecado. Cá fora está um pouco por conta dos humanos: multiplicar agrada ao Senhor e, se para isso, for necessário cortejar e dar todos aqueles passos até ao êxtase, pois bem, assim seja.

Então, o amor amadureceu, cresceu em qualidade, cresceu em número. Vemo-lo por aí na rua, nos bancos de jardim, nos parques, mais escondido, mais às claras, fazendo jus ao nome, trocando salivas, misturando fluidos. Tudo com a generosa graça de Deus. Antes o rapaz olhara a rapariga e sentira uma vibração por todo o corpo. Dilataram-se todos os poros e parecera que todos os pêlos se haviam encrespado. Era aquela a mulher da sua vida. Tinha de a conquistar! E agora os dois já fazem parte do rol dos namorados, a arrulhar por todos os cantos, com mais ou menos timidez, mas nunca na frente do futuro sogro. Junto dela o tempo passa demasiado depressa, numa felicidade indescritível; sem ela o relógio não avança, num tormento atroz. Receia perdê-la. Ocorrem-lhe toda a espécie de pensamentos negros. Vê o mundo como um perigo constante a ameaçar a existência da sua amada. “Como estará ela? Terá comido bem? Será que traz aquele vestido azul? Preferia que trouxesse calças. Estará a pensar em mim?” Oh, como seria bom fundir-se com ela em corpo e espírito: comer o que ela come, caminhar com os seus passos, olhar o que ela vê, sentir o que ela sente, dormir o seu sono e apegar-lhe o seu amor para que ela não pudesse, jamais, fugir. É um sentimento ardente, amargo, consolado, dorido, inquieto, feliz. E esses pensamentos rebuscados levam-no sempre a um recolhimento. E, por vezes, lê. E lê Camões:

Amor é um fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que ganha em se perder.

                       
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo amor?

Mas a seguir é outro dia. É um daqueles dias! E os dois apaixonados, mesmo que ainda não amantes, vão conhecer-se, aproximar gostos, virar o avesso, tolerar-se, amar-se. Será um amor diferente do dos pais ou avós, de quem num futuro próximo se afastarão. Será um amor profundo, apaixonado, completo. Ela será a sua melhor amiga, que o ouvirá e ajudará em todos os momentos, melhores ou piores; será como a sua mãe que dele tratará como se dela fosse; será a sua amante, que com ele partilhará a felicidade, o prazer. E mais tarde os dois recordarão todos os momentos que em si próprios encontraram alimento, comendo-se e roendo-se desvairadamente, como se o mundo fosse acabar, ou temessem que a tal ordem de expulsão não se confinasse ao Paraíso e chegasse ali ao quarto.

E a seta de Cupido prossegue incessante e atinge onde menos se espera. E mais um rapazito olha para trás e mira as formas roliças da rapariguita. Ela apercebe-se, olha também para trás, sorri satisfeita, toda vaidosa, orgulhosa do que tem, ciente do que vale, da atracção que a rodeia, da realidade da sua formosura, do seu andar rodopiante, do seu menear de cabeça, do seu peito erecto, da sua resplandecência.

E o outro rapaz, ao lado do rapazito, com uma observação mais cuidada, mais material, mais adulta, mais desejosa, pensará de outra forma, com mais ou menos saliva: há realmente um Deus algures…